Chamam-lhe "compromisso brincalhão" e o
objectivo é provocar o debate. O duplo plural, o plural feminino genérico
e o uso da arroba (@s), do x (xs) ou do asterisco (*s), em vez de 'os'
para considerar os dois géneros são algumas das propostas para um novo
acordo da língua portuguesa.
O Acordo Queerográfico, já subscrito por mais de 100
pessoas, surgiu "da pura necessidade", como explica Pedro Feijó, 21
anos, estudante de Estudos Gerais da Universidade de Lisboa e uma das
caras por trás do movimento que pretende "mostrar como a linguagem é
instrumento de dominação social".
Querem tornar "caótica" a representação do género e
inventar palavras como "a Presidenta", ou "a Mulher" como símbolo da
Humanidade. "E não estamos a criar uma forma de escrita normativa. Tem a
ver com desestabilização e não com a criação de um correcto", explica.
Propõem ainda palavras como "tod*s", "xs pessoas" ou
"velh@s", mas o "silencioso" asterisco (*) ou o "incómodo" x ou a
arroba (@) não têm leitura e não existem ainda opções para a oralidade.
Uma lacuna em que estão agora a trabalhar.
Linguistas duvidam do sucesso de um acordo deste género
Mas especialistas, como João Veloso, professor na
Universidade do Porto e presidente da Associação Portuguesa de
Linguística, não acreditam no projecto. "Já existiram, noutros países,
movimentos semelhantes e a intenção é louvável, mas o argumento de que
na linguagem o género feminino é subjugado ao masculino não é válido
porque não há razões científicas para isso, é uma questão gramatical e
não cultural", afirma.
Segundo João Veloso, as línguas são elementos
naturais que não evoluem "por decreto". Já o professor da Universidade
da Beira Interior e especialista em evolução da linguagem, Paulo Osório,
não estranha que a proposta tenha vindo de jovens, naturalmente mais
abertos à inovação.
Pedro Feijó, em conversa com o Expresso, utilizou sempre o plural no feminino, como manda o manifesto publicado online
, pois "o plural masculino apaga as mulheres". O alvo é a sociedade
heteropatriarcal: uma sociedade onde a regra imposta é a da família
nuclear e as relações binárias e heterossexuais. A ideia é convidar os
outros a utilizarem o acordo e a construí-lo.
"Esta proposta é muito complexa porque os usos orais
são marcados pelos hábitos mas a ortografia é marcada por normas
regulamentadas. É complicado que as pessoas integrem esses usos, até
porque eles demoram muito tempo a entrar na língua, para que sejam
estandardizados pode demorar séculos", explica o professor Paulo Osório
que não acredita que as mudanças se alastrem além do grupo.
O manifesto, escrito por Pedro Feijó e que teve o
contributo e revisão de outras pessoas, serve para atestar a existência
deste modo de escrever. "Já fiz um teste em que comecei por dizer: 'Este
texto está redigido em concordância com o Acordo Queerográfico', agora
estou à espera da nota", conta orgulhoso o autor.
Paulo Osório admite que, como professor, não iria aceitar um teste escrito assim.
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